segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Sonhos e gavetas

De vez em quando a gente ouve alguém dizer que sonha com  isso, sonha com aquilo, que tem muitos sonhos a realizar. Às vezes eu, influenciado por esses sonhadores, me ponho a pensar em por onde andam meus próprios sonhos.
Mas que sonhos? Parece que em geral as pessoas traduzem como sonhos seus desejos de consumo e necessidades de vida: comprar casa e carro, fazer faculdade, arrumar "aquele" emprego, passar no concurso, etc. Tudo muito justo e necessário, mas é essa a natureza dos sonhos? Eu desejei e ainda desejo algumas dessas coisas, mas não são sonhos. São consequências do meu esforço e de um pouquinho de sorte também, por que não? Então, quais são meus sonhos? A verdade é que não sei. Poderia dizer que quero alguma coisa de bom para o futuro dos meus filhos, por exemplo, mas não tenho direito de sonhar para eles, mesmo porque não há garantias em relação ao futuro de ninguém.
Então não tenho sonhos? É possível. Ou talvez eu tenha feito (assim espero!) como o pai do trio de irmãos de Peter Pan:

"Sra. Darling: Há muitos tipos de coragem. Há a coragem de pensar no outros antes de si mesmo. Seu pai nunca brandiu uma espada nem atirou com uma arma, graças aos céus. Mas ele fez muitos sacrifícios pela família, e abriu mão de muitos sonhos.

Miguel: Onde ele os colocou?

Sra. Darling: Numa gaveta. E ás vezes, tarde da noite, nós os tiramos de lá e os admiramos. E é cada vez mais difícil fechar a gaveta... E ele fecha. E por isso ele é corajoso."

Sonhos e gavetas.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Vox Dei

A voz do povo é a voz de deus. No Brasil isso é levado a sério, na verdade essa noção está presente quase que em todas as discussões sobre política e nem sempre de uma maneira produtiva. O que quero dizer é que nessas discussões sempre aparecem alguns padrões comuns nas religiões judaico-cristãs, que vou listar abaixo.
Lembrando que isso é só minha opinião! Pois aí vai:

1. A expulsão do Paraíso: em qualquer conversa sobre política ou a situação do país, sempre vai aparecer alguém pra dizer que antes era melhor. Como se em algum lugar do passado houvesse um Brasil bom e justo, no qual as pessoas podiam se sentir seguras e felizes. Mas então este ou aquele político se elegeu, ou algum outro tipo de fruto proibido foi mordido, e voilà, fomos expulsos do paraíso e hoje vivemos no vale da sombra e da morte. Chegam a se esquecer dos crimes da ditadura, da inflação de 200%, do desemprego, dos 60% de analfabetos. E se você diz que antes tínhamos basicamente os mesmos problemas de hoje, sempre respondem com um "mas era diferente". Em toda minha vida nunca estive nesses campos elísios, sempre vi todos ao meu redor tendo que lutar muito pra sobreviver, portanto não conheci esse paraíso perfeito.

Não é de hoje
2. O Messias: eu arrisco dizer que isso é algo que sempre ocorreu, mas se tornou bastante óbvio após a redemocratização do país. O povo quer um messias, um salvador que irá nos livrar do mal, amém. Foi assim com Tancredo Neves, Collor, FHC e Lula. Seja um velhinho simpático, um caçador de marajás, um grande estadista ou um homem do povo (considerem todas as descrições entre aspas). O povo perdido, incapaz de lutar contra o grande mal que o assola, precisa de um homem que se levante e o salve ou que pelo menos o guie pelo deserto. E já temos um novo candidato ao cargo.

Mas hein?

3. O povo escolhido: essa não é uma noção exclusiva do brasileiro, mas tem se tornado cada vez mais comum e não de uma maneira positiva. Cada vez mais tem aparecido gente que pensa que tem todos os direitos do mundo, mesmo que passe por cima dos outros. Aos poucos isso nos tem levado a pensar que de uma forma ou de outra somos superiores, algo que aparece bastante na época das eleições: o sul-sudeste azul é melhor que o norte-nordeste vermelho. Quantas vezes li que é por causa dos nordestinos que o país está tão ruim? Imagino que o pensamento contrário também exista.

Tinha que ser um azul, claro


4. O livro sagrado: também conhecido como mídia e sites governamentais. Algo constantemente usado, inclusive por este que vos fala, para esfregar na cara do outro o quanto a crença dele está errada. Não importa a veracidade, não importa a fonte. O que importa é que alguém "inspirado" pelo espírito santo foi capaz de descrever tudo que eu sinto que está errado, e muitas vezes basta que esteja publicado para que se torne verdade, mesmo sem nenhum embasamento na realidade.

Meu preferido

Deixem-me dizer que estas são só observações, nada sério aqui. Não pretendo ofender nem defender lados, só queria mostrar o quão arraigados estes preceitos estão na nossa cabeça.

Cheers!